Dona Raquel
>> sábado, 16 de outubro de 2010
Já mostrei pra vocês a estátua do Drummond aqui no Rio, mas nunca mostrei a estátua de Dona Raquel, lá em Fortaleza.
Tenho uma história ótima de Drummond, que me foi contada por minha professora de tudo, Odalice Castro e Silva, uma vez que ela ouviu Drummond ler recitando um poema e o tanto que ela se espantou (do jeito dela, que nunca se espantava, ao menos eu não imagino Profa. Odalice a se espantar com nada) com a voz fraca e tímida de um homem de lira tão atrevida, quanto Drummond. Quem vê cara...
Mas vamos falar de Dona Raquel. Olha ela ai.
A estátua fica na Praça dos Leões, que um dia foi linda, próxima à Academia Cearense de Letras, que um dia foi linda, também. O Centro todo conta a mesma história, que um dia foi lindo.
Dona Raquel de Queiroz foi a primeira mulher membro da Academia Brasileira de Letras. É, meu povo, a que fica aqui no Rio. Mas ela afirmava (e eu não acredito) que nem ligava pra isso, porque seu negócio era jornalismo, literatura era pra pagar as contas.
Uma vez, quando eu nem ao menos cursava Letras, fui ao encontro de uma das conversas mais interessantes, apesar de rápidas, da minha vida. Na Academia Cearense de Letras, uma mesa redonda com Raquel de Queiroz.
Isso era coisa rara, Raquel era muito reservada (chata) e pouco se dava ao desfrute, na minha concepção, como tem que ser. Exibido já tem o Paulo Coelho, a ele cabe super bem este papel, mas voltando.
Pra meu espanto, um encontro raro como este, Raquel ali desfrute, e quase seu ninguém foi.
Ao final, dei de cara com a própria Dona Raquel, sentadinha no sofá de couro do hall da Academia. Acho autógrafo o cúmulo da babaquice, mas rubrica do escritor num livro é a coisa mais linda, dai que me atrevi e fui ter com ela (que eu já sabia que era chata) e perguntei, muito metida, se poderia ter um dedinho de prosa com ela. Não queria autógrafo, nem nada (eu com Dora, Doralina nas mãos) e ela me respondeu que sim, muito risonha, mas se fosse rápido, porque não gostava muito de prosear com mulheres, que eram lassivas e enfadonhas.
Nesta hora eu desenhei meu próprio rosto na mente, arqueando minha sobrancelha direita e rindo assim, de mim mesma. Mas sentei ao seu lado e só quis saber (o que eu já sabia), porque ela pensava assim das mulheres, afinal, ela era o quê, né?
Ela era muito risonha, como eu disse, mas aquela 'risonhez' de quem debocha do mundo, sabe? Era interessante, porque aquele ar de quem escarneia de tudo e de todos, não combinava muito com sua indumentária e aparência de senhorinha bondosa. Quem vê cara...
Dona Raquel e seu simplíssimo vestido de florzinhas, os cabelos grisalhos e o sorriso sem fim de quem já sabe de tudo e o que não sabe, lá importa.
Esta é a máxima de quem ama dormir sob os respingos da chuva nas casas de telhas coloniais e do embalo da rede.
Bisous.
Imagem: Wikipédia.